quinta-feira, 5 de abril de 2007

Decrépito Banquete

Estou devorando as entranhas de um feto há muito esquecido,
Neste lugar onde outrora não sabia nem como chegar,
Eu, que antes fui rei, e pisei nos desvalidos,
Agora faço parte da massa dos esquecidos,
E todos os dias pago meu odioso sacrifício diante deste pútrido altar...
À minha volta vejo idosos, vejo crianças,
Mulheres, homens vis matando-se por um mísero pedaço de carne decaída,
O fétido aroma dos dejetos maltrata-me as narinas,
Nesta terra dura onde hoje não somos mais do que filhos
Da peste negra e das guerras, a sobra, após a devastação,
Somos nós, os esquecidos leprosos,
Lazarentos, portadores da mais temível doença,
Farrapos humanos, jogados como carne podre que nos tornamos,
Dentro de porões, como tristes máscaras deformadas,
Pelo horror e pela angústia,
Daqueles que mesmo sem nos ver,
Apenas imaginam... E temem...
Alimentamo-nos das sobras, e de nós mesmos...
Neste decrépito Banquete,
Onde sei que hoje serei... Um dos alimentos preferidos...
“- Devorem o Rei, Devorem o Rei!!!”, gritam meus monstruosos súditos,
E levam-me amarrado, amordaçado, com meus imundos farrapos,
Que já foram ricos ornamentos,
Agora espero, em agoniante silêncio,
Quem será o primeiro a fartar-se
Do meu corpo sujo, e dilacerado,
No altar profanado,
Onde muitos, antes de mim,
Foram oferenda que deixaram os temíveis habitantes
Deste Reino maculado pela doença, ligeiramente saciados.

FST