sexta-feira, 13 de abril de 2007

À Minha Amada Tuberculosa

Qual animal sorrateiro, adentro os portões da capela,
Para ajoelhar-me mais uma vez diante dela:
A mais casta, a mais pura e a mais bela;
“- És tu, minha amada donzela” – choro eu, enamorado -
Que tão cedo foi levada pela mais cruel de todas as enfermidades:
“Tuberculose!”, penso eu, e calo meu coração amargurado...
Lembro-me como se fosse hoje
Quando descobristes a fatal moléstia:
Andavas tu, no teu mais belo cavalo,
E eu te guiava a pé (pobre lacaio)
Quando uma forte tosse acometeu-te,
E em teu alvo lenço, que susto imenso!
Gotas escarlates de sangue adoecido,
Misturado com a espessa mucosa por ti expelida...
Assustada, tu pediste meu silêncio, e mesmo sem saber,
Deu-me de presente uma pequena recordação
Que ainda hoje carrego junto ao meu peito:
O fino pedaço de pano que continha o teu mistério...
Como eu o beijei, e ainda o pego,
Com mãos delicadas e boca desesperada,
Pelos fartos beijos apaixonados que não beijei (somente em sonho)...
A cada dia senti em tua face
A marca dura da doença que aos poucos te consumia,
E velava teu sono, tão breve pela noite, e tão farto no claro dia,
Sem ao menos poder tocá-la, e a excitação me subia,
Ao simples vislumbrar do teu frágil peito arfante,
Que subia e descia em ritmo ofegante,
Quando as crises te acometiam, e tu ficavas delirante...
Quantas vezes eu bebi o teu catarro sanguinolento,
Quando, para impedir os ouvidos mais atentos,
De escutar-te a tosse repetida em tormento,
Calei tua boca com a minha, silenciando também os teus lamentos...
Quando finalmente o véu negro da morte
Cobriu teu rosto e transformou-te em esposa para toda a eternidade,
Gritei e gemi, com tamanha bestialidade,
Que como louco fui julgado,
E condenado a vagar sozinho, tendo como única companheira,
A dolorosa saudade do teu rosto pálido agora tão distante...
A dor é tão imensa neste instante,
Que com força sem medida quebro o grosso vidro do teu leito de infinito repouso,
E danço contigo uma ensandecida valsa celebrando nossas bodas,
Eu, o teu eterno escravo apaixonado, e tú, a morta dama dona do meu ser...
Meu corpo quente, junto ao teu que está tão frio,
Excita-me tanto, que com total desvario,
Rasgo-te o fino vestido de seda farfalhante,
E tomo-te como consorte e como amante!
Como é dura a carne pela morte carcomida,
E quão duros são teus lábios, que há muito perderam a rosácea cor,
Enterro-te, quinze, vinte vezes minha espada intumescida,
E afogo tuas ancas com meu sêmen em quantidade descomunal...
E vivo ao teu lado, parcos dias de alegria ensandecida,
Até ser descoberto, e julgado como profano despudorado,
E terminar meus atormentados dias aqui,
Neste mausoléu de seres vivos e abandonados,
Urrando teu nome, sentindo o gosto do teu sexo pelo meu explorado,
Teu incansável servo, escravo deste louco amor,
Que nunca em vida por ti foi sequer imaginado,
Mas em morte, pelo meu ávido desejo, foi sumariamente consumado.

FST – 27/03/07 – 21:00h